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“É crucial desmistificar a ideia de que pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) são incapazes de ter relacionamentos amorosos”, diz neuropediatra

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O ator galês Anthony Hopkins e o cantor Vitor Fadul – Foto divulgação

A neuropediatra Estéfani Ortiz (CRM-RS 40.870 e RQE 40.131) comenta que indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm desejos, necessidades emocionais e afetivas como qualquer outra pessoa. Ela afirma que, embora possa haver desafios específicos, a possibilidade de se apaixonar, conectar-se emocionalmente e construir vínculos românticos é real, como, por exemplo, o ator galês Anthony Hopkins, casado e pai de uma filha, ou o cantor Vitor Fadul, que atualmente namora. “O que torna o relacionamento único é que ele pode precisar de adaptações e de uma comunicação mais direta e empática para funcionar de maneira saudável e satisfatória para ambas as partes”, aponta.

Segundo a especialista, pessoas com TEA podem enfrentar uma série de desafios específicos nos relacionamentos amorosos, incluindo:

Comunicação: a expressão de sentimentos e emoções pode ser mais direta ou parecer mais limitada, o que pode causar mal-entendidos. Autistas podem ter dificuldade em perceber o tom de voz, o subtexto de frases ou entender sinais sutis que o parceiro considera óbvios.

Sensibilidade​sensorial:​para​ alguns ​autistas,​o​ toque ​físico​ pode ​ser desconfortável ou mesmo doloroso. A questão sensorial afeta não apenas o contato físico direto, mas também a convivência em locais com muitos estímulos, como sons altos ou luzes fortes, que podem causar estresse e dificultar momentos a dois.

Interpretação de sinais sociais: autistas têm dificuldades em interpretar gestos, expressões faciais ou linguagem corporal, o que pode dificultar a leitura das emoções do parceiro. Eles podem não perceber sinais de desagrado ou tristeza, o que pode causar frustração no relacionamento.

Dificuldade com mudanças: relacionamentos amorosos exigem flexibilidade e adaptação constante, e isso pode ser desafiador para alguns autistas que preferem uma rotina estruturada e previsível. Mudanças nos planos ou uma rotina instável podem gerar estresse, causando impacto na relação.

Dificuldade para pais, amigos e familiares perceberem que autistas podem ser pessoas sexuadas
A médica lembra que essa é uma dificuldade que muitos familiares enfrentam, pois a imagem estereotipada de que autistas não têm necessidades emocionais ou afetivas complexas faz com que alguns pais e familiares os vejam apenas como seres “neutros” ou “infantis”. Estéfani chama a atenção que a falta de entendimento sobre a sexualidade e afetividade dos autistas pode levar a uma superproteção ou a uma abordagem ignorante quanto às necessidades emocionais e sexuais deles.

Essa percepção errada muitas vezes cria barreiras para que a pessoa com TEA possa explorar e expressar sua sexualidade e seus relacionamentos de forma saudável. “O reconhecimento de que autistas também têm uma vida emocional e afetiva pode ajudar familiares a oferecer suporte e orientação mais adequada para explorarem esses aspectos de forma segura e respeitosa”, pontua.

Expressar sentimentos
De acordo com a neuropediatra, muitas pessoas com TEA encontram dificuldades em expressar seus sentimentos de maneira que seja facilmente compreendida pelos outros. Em alguns casos, eles podem experimentar emoções intensas, mas acham desafiador demonstrá-las por meio de palavras ou gestos. Para quem convive com autistas, isso pode parecer frieza ou indiferença, mas, na realidade, pode estar experimentando um mundo emocional rico e complexo.

Dra. Estéfani Ortiz – Foto divulgação

Como destaca a especialista, a falta de expressão ou uma expressão considerada “atípica” não significa que a pessoa não sinta. A dificuldade pode ser trabalhada em terapia, onde a pessoa aprende maneiras de se expressar e de entender o que os outros esperam dela em termos de comunicação emocional. Essa conscientização também é importante para os parceiros, que precisam ajustar suas expectativas e entender que a expressão emocional do autista pode ser diferente, mas é igualmente válida.

O hiperfoco pode atrapalhar o relacionamento amoroso
Estéfani conta que o hiperfoco é uma característica comum entre os autistas e consiste em uma intensa concentração em um interesse específico. Ela explica que isso pode interferir em relacionamentos, pois o autista pode dedicar grande parte do seu tempo e energia a esse interesse, tornando-se menos atento às necessidades do parceiro ou à dinâmica do relacionamento.

A neuropediatra argumenta que para o parceiro pode parecer uma forma de desinteresse ou negligência. Entretanto, é importante reforçar que o hiperfoco não é intencional, e o autista pode nem perceber que está dedicando menos tempo ao relacionamento. “Trabalhar juntos para estabelecer momentos em que o autista possa se dedicar ao hiperfoco, sem prejudicar o relacionamento, é uma estratégia que pode ser benéfica para ambos”, orienta.

Toque físico e rejeição
A especialista pondera que lidar com a sensibilidade ao toque e a possibilidade de rejeição requer paciência, comunicação e respeito mútuo. Para muitos autistas, o toque físico pode ser desconfortável, especialmente quando é inesperado ou intenso. Ela recomenda que o parceiro deve compreender que isso não se trata de rejeição pessoal, mas de uma necessidade sensorial que o autista possui.

Portanto, a comunicação aberta é essencial para que ambos entendam os limites e preferências de cada um, uma vez que introduzir o contato físico de forma gradual e consensual pode ajudar a construir uma conexão segura e agradável. “Por outro lado, o parceiro deve entender que a aversão ao toque não é um sinal de desamor. Com o tempo e o desenvolvimento de uma relação de confiança, o autista pode se sentir mais à vontade para expressar afeto de outras maneiras que não envolvem necessariamente o contato físico constante”, finaliza.

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